Coluna de Sergio Faraco, publicada hoje no Segundo Caderno, de Zero Hora.
O advogado Tairone Rossi era afamado na fronteira-oeste como paladino das causas perdidas, e tanto no foro cível como no criminal sobreluziam seu saber jurídico, sua inteligência, sua astúcia.
Ao escritório, instalado nas peças da frente do palacete em que vivia com a esposa, Dona Veva, vinha a clientela em romaria: homens da cidade e homens do campo, trazendo no rosto a angústia e o temor de um prejuízo. Mulheres não vinham, maridos e noivos não deixavam. Dr. Tairone era tido por femeeiro, e senhora ou senhorita que cruzasse aquela porta haveria de cruzar também, na voz do zé, a porta do serralho. Na época, comentava-se o envolvimento que teria com uma ex-miss.
Isto era o que se dizia e até se pichava nas ruas da cidade, como aquele TAIRONE BICO DOCE que amanheceu na fachada do fórum, mas ninguém podia precisar até que ponto os mexericos configuravam uma legítima adaequatio intellectus et rei. Jamais alguém o vira acompanhado senão por Dona Veva e ele mesmo nada revelava, embora fosse um tipo loquaz. De uma loquacidade especial, sublinhe-se. Encarnava de tal modo a fácies forense que, mesmo num cavaco entre amigos ao balcão do café, nunca se sabia se sua palavra correspondia ao que pensava ou era um exercício de hermenêutica.
Uma só vez dr. Tairone dispensou a advocacia e a verdade formal para homenagear a sinceridade e a verdade material: foi quando adoeceu com gravidade, sendo desenganado pelos médicos. No leito de morte, concluiu que era chegada a hora de abrir o coração à santa e calada esposa. Confessou, pedindo perdão, que de fato andara adoçando o bico com a ambrosia da miss.
Dona Veva, comovida, perdoou-o.
Mas a Morte, ou porque se esqueceu, ou porque errou o CEP, não veio buscar dr. Tairone, e a despeito dos prognósticos médicos ele começou a melhorar e foi melhorando até que teve alta do hospital. A viúva putativa interpretou essa convalescença como um deboche e, mesmo sem conhecer os brocardos tão caros ao marido, aplicou ao caso aquele que ensina que, suprimida a causa, cessa o efeito. Ah, não morria? Cancelou o perdão e meteu no quase de cujus um processo de separação que, lá na fronteira, provocou um rodeio de desquites e escândalos.
O advogado Tairone Rossi era afamado na fronteira-oeste como paladino das causas perdidas, e tanto no foro cível como no criminal sobreluziam seu saber jurídico, sua inteligência, sua astúcia.
Ao escritório, instalado nas peças da frente do palacete em que vivia com a esposa, Dona Veva, vinha a clientela em romaria: homens da cidade e homens do campo, trazendo no rosto a angústia e o temor de um prejuízo. Mulheres não vinham, maridos e noivos não deixavam. Dr. Tairone era tido por femeeiro, e senhora ou senhorita que cruzasse aquela porta haveria de cruzar também, na voz do zé, a porta do serralho. Na época, comentava-se o envolvimento que teria com uma ex-miss.
Isto era o que se dizia e até se pichava nas ruas da cidade, como aquele TAIRONE BICO DOCE que amanheceu na fachada do fórum, mas ninguém podia precisar até que ponto os mexericos configuravam uma legítima adaequatio intellectus et rei. Jamais alguém o vira acompanhado senão por Dona Veva e ele mesmo nada revelava, embora fosse um tipo loquaz. De uma loquacidade especial, sublinhe-se. Encarnava de tal modo a fácies forense que, mesmo num cavaco entre amigos ao balcão do café, nunca se sabia se sua palavra correspondia ao que pensava ou era um exercício de hermenêutica.
Uma só vez dr. Tairone dispensou a advocacia e a verdade formal para homenagear a sinceridade e a verdade material: foi quando adoeceu com gravidade, sendo desenganado pelos médicos. No leito de morte, concluiu que era chegada a hora de abrir o coração à santa e calada esposa. Confessou, pedindo perdão, que de fato andara adoçando o bico com a ambrosia da miss.
Dona Veva, comovida, perdoou-o.
Mas a Morte, ou porque se esqueceu, ou porque errou o CEP, não veio buscar dr. Tairone, e a despeito dos prognósticos médicos ele começou a melhorar e foi melhorando até que teve alta do hospital. A viúva putativa interpretou essa convalescença como um deboche e, mesmo sem conhecer os brocardos tão caros ao marido, aplicou ao caso aquele que ensina que, suprimida a causa, cessa o efeito. Ah, não morria? Cancelou o perdão e meteu no quase de cujus um processo de separação que, lá na fronteira, provocou um rodeio de desquites e escândalos.